“Na última vez, dei com a cara no portão, porque a visita era semanal, agora é quinzenal e ninguém avisou a gente. Perdi toda a comida que tinha preparado e nem aceitaram receber e entregar para meu marido o que tinha levado”. O relato é um dos trechos do vídeo Liberta, que reúne depoimentos de mulheres familiares de pessoas em privação de liberdade no sistema prisional baiano. A carta que deu origem ao vídeo foi produzida no encerramento do Projeto Liberta, uma iniciativa de Educação Jurídica Popular, que realizou formações com familiares de pessoas privadas de liberdade sobre os seus direitos, apoiando-as na identificação e atuação frente a essas violações. Elaine Paixão, articuladora da Frente Estadual pelo Desencarceramento da Bahia, destacou a importância de divulgar a situação dos familiares como forma de denúncia a fim de obter avanços na atual condução do sistema prisional baiano.
“É importante, porque dá uma outra visibilidade. A mídia muitas vezes reproduz a ideia de que o cárcere é um hotel. Dentro do cárcere existem diversas formas de violação absurdas para um ser humano, tortura física, falta de alimentação, pavilhões lotados, entre outras. É necessário que essa informação saia dos limites de quem lida com isso diariamente”, afirma. Embora as mulheres não sejam as principais vítimas do encarceramento em massa no país, elas são as principais atingidas por essa realidade, porque ser familiar de uma pessoa encarcerada é ter também seus direitos violados diariamente. Elas são duplamente penalizadas por esse sistema quando familiares de presos passam por revistas vexatórias, preconceitos, negação de visitas e, com isto, são também criminalizadas. Quando presas são abandonadas por familiares e pelo estado.
“As familiares, digo isto, porque são majoritariamente mulheres que visitam seus maridos e filhos privados da sua liberdade, vivenciam a extensão da pena atribuída ao seu familiar e as violências vivenciadas no sistema prisional carcerário. Isto porque, essas mulheres são expostas e acometidas a uma série de constrangimentos, desde as regras para visitação que mudam constantemente, sem informação prévia, até às reiteradas revistas vexatórias, que mesmo totalmente inconstitucional, é retomada de tempos em tempos nas unidades prisionais do Estado da Bahia", explica a advogada popular e associada da AATR, Lays Franco.
O vídeo integra as ações do Projeto Liberta, realizado pela Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais (AATR), com apoio do Fundo Brasil de Direitos Humanos. Sistema prisional - Segundo dados do Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional (SISDEPEN), o Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, 67,81% são pessoas pretas ou pardas, a maioria homens.
No estado da Bahia, o contexto é ainda mais grave, com 93,41% das pessoas privadas de liberdade pertencentes a esse grupo étnico-racial. A Lei de drogas é o tipo penal que mais encarcera mulheres e o segundo que mais encarcera homens no Brasil. Os dados demonstram que o Estado brasileiro sustenta o seu projeto de encarceramento em massa de pessoas negras a partir da justificativa perversa de uma suposta guerra às drogas.
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